Prof. Dr. Stelio Alessandro Marras
Objetivos:
O curso versará sobre estudos de antropologia da ciência e das técnicas como via de acesso para uma melhor compreensão dos fundamentos e das dinâmicas da modernidade, cuja arquitetura intelectual e prática assenta-se nos pólos da Natureza e da Sociedade. A abordagem se concentrará nas reviravoltas ontológicas e epistemológicas contemporâneas constrangidas pela emergência da natureza na política – tão cabalmente expressa pelos fenômenos ecológicos. Nesse sentido, a metodologia da ANT (Actor-Network-Theory), originada dos chamados Science Studies, parece mostrar-se especialmente pertinente para seguir e descrever pegadas ecológicas e seus rastros a um só tempo humanos e não humanos. Tal metodologia pretende-se transversal tanto em relação ao naturalismo quanto ao relativismo, estes dois principais partidos epistemológicos da modernidade.
Justificativa:
A antropologia da ciência e da tecnologia tem crescido enormemente nas últimas décadas. Também a antropologia brasileira vem se interessando cada vez mais por essa área de inovação, cujo impacto nas ciências sociais e no pensamento contemporâneo torna-se cada vez mais incontornável. Ademais, seu rendimento heurístico mostra-se altamente valioso em um momento histórico que assiste a crises de regime de verdade no centro da modernidade. O curso deve, portanto, valer-se dessas novas perspectivas epistemológicas em Ciência, Tecnologia e Sociedade para repor o par objetividade/subjetividade em um plano de composição do real, não mais de oposição ou exterioridade pura e simples entre seus termos.
Conteúdo:
O curso deve abordar os seguintes temas: Como situar a antropologia nos estudos de ciência? Qual o partido epistemológico e o rendimento de uma antropologia da ciência na compreensão da modernidade? Como considerar o candente dilema contemporâneo em antropologia a respeito do que seja o dado e o construído nos fenômenos sociais, tais os relativos aos movimentos ecológicos? Como situar a noção de cultura e sociedade (campo das soft sciences) em contraste à noção de ciência e natureza (campo das hard sciencies) face aos impactos epistemológicos oriundos dessa abordagem? Como considerar o impacto na antropologia a partir dos graves problemas ecológicos contemporâneos?
Bibliografia:
BATESON, Gregory
1996. Metadiálogos. Lisboa: Gradiva.
Chakrabarty, Dipesh. “The Climate of History: Four Theses”. Critical inquiry 35.2: 197-222; 2009.
Danowski, Déborah & Viveiros de Castro, Eduardo. Há mundo por vir? Ensaio sobre os medos e os fins. Florianópolis: Cultura e Barbárie, 2014
GLEICK, James
1989. Caos – a criação de uma nova ciência. Rio de Janeiro: Elsevier.
Haraway, Donna. Staying With the Trouble: Making Kin in the Chthulucene. Durham: Duke University Press, 2016
JACOB, François
1981. Le jeu des possibles – essai sur la diversité du vivant. Paris: Fayard.
LATOUR, Bruno
1994. Jamais fomos modernos: ensaio de antropologia simétrica. São Paulo: Ed. 34.
2000. Ciência em ação: como seguir cientistas e engenheiros sociedade afora. São Paulo: Editora da Unesp.
2001. A esperança de Pandora – ensaios sobre a realidade dos estudos científicos. Bauru, SP: Edusc.
2002. Reflexão sobre o culto moderno dos deuses fe(i)tiches. Bauru, SP: Edusc.
2004a. Políticas da natureza – como fazer ciência na democracia. Bauru, SP: Edusc.
2004b. ―Por uma antropologia do centro. (Entrevista por Renato Sztutman e Stelio Marras). In: Revista Mana: Estudos de Antropologia Social 10(2). Rio de Janeiro: Museu Nacional/PPGAS/UFRJ.
2005. Reassembling the social – an introduction to Actor-Network-Theory. Oxford: Oxford University Press.
2006. ―Como terminar uma tese de sociologia: pequeno diálogo entre um aluno e seu professor (um tanto socrático)‖. In: Cadernos de Campo 15(14-15). São Paulo: Departamento de Antropologia/PPGAS/FFLCH/USP.
s/d. Guerre des mondes: offres de paix. In: http://www.bruno-latour.fr/articles/article/081.html
LATOUR, Bruno & WOOLGAR, Steve
1997. A vida de laboratório – a produção dos fatos científicos. Rio de Janeiro: Relume Dumará.
Latour, Bruno. Face à Gaïa. Huit conférences sur le nouveau régime climatique. Paris, La Découverte, 2015. (Introdução, Primeira, Quarta e Sexta conferências). [tradução em português: Ed. Ubu, 2020]
Latour, Bruno. Où atterrir — comment s’orienter en politique. Paris, La Découverte, 2017. [tradução em português: Ed. Bazar do Tempo, 2020]
MARRAS, Stelio
2006. ―Como não terminar uma tese: pequeno diálogo entre o estudante e seus colegas‖. In Cadernos de Campo 15(14-15). São Paulo: Departamento de Antropologia/PPGAS/FFLCH/USP (jan.-dez.).
MARRAS, Stelio. O Brasil e os brasis no Antropoceno: bifurcações à vista. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, Brasil, n. 77, p. 126-142, dez. 2020.
MONOD, Jacques
1971. O acaso e a necessidade. Ensaio sobre a filosofia natural da biologia moderna. Petrópolis, RJ: Vozes.
PRIGOGINE, Ilya
1996. O fim das certezas: tempo, caos e as leis da natureza. São Paulo: Editora Unese.
PRIGOGINE, Ilya & STENGERS, Isabelle
1984. A nova aliança: metamorfose da ciência. Brasília: Editora da UnB
SHAPIN, Steven & SCHAFFER, Simon
1985. Leviathan and the Air-Pump: Hobbes, Boyle, and the Experimental Life, Princeton: Princeton University Press.
SIMONDON, Gilbert
1964. L’individu et as gênese physico-biologique: l’individuation forme et d’information. Paris: PUF.
STENGERS, Isabelle
2002. A invenção das ciências modernas. São Paulo: Editora 34.
STRATHERN, Marilyn
1996. “Cutting the Network‖. In: Journal of the Royal Anthropological
TARDE, Gabriel Tarde.
2007. Monadologia e sociologia – e outros ensaios. São Paulo, Cosac Naify, 2007
Tsing, Anna. The Mushroom at the End of the World: On the Possibility of Life in Capitalist Ruins. Princeton, Princeton University Press, 2015
WALLACE, A. R.
2003. [1858] “Sobre a tendência das variedades a afastarem-se indefinidamente do tipo original”. In: Scientiæ Studia. Revista LatinoAmericana de Filosofia e História da Ciência 1(2): 231-43. São Paulo: FFLCH/USP.